domingo, 14 de maio de 2017

A doença e a dor como dom…




Um dos momentos que mais me emocionou na visita do Papa Francisco a Portugal nos últimos dias 12 e 13 de maio de 2017, foi quando ele se dirigiu aos doentes que estavam no Santuário de Fátima – Portugal, ao fim da missa do dia 13.

Passar por uma doença, pode ser visto por muitos como maldição, como assim pensavam no tempo de Jesus. 

No entanto, Jesus transformou a sua cruz em ressurreição e a partir de então, a doença e a dor tiveram um alcance, que ao longo destes dois mil anos da Igreja Católica, muitos santos e santas perceberam com diversas intensidades.

Nas passadas semanas, estive a ler mais em pormenor as histórias das vidas dos novos santos católicos Francisco e Jacinta Marto, que foram canonizados no dia 13 de Maio no Santuário de Fátima com a presença do Papa Francisco. 

Para pintar os seus retratos, aprofundei-me nas suas histórias de vida e fiquei extremamente surpresa com o facto de simples crianças, ainda tão novas, sem grande cultura, perceberem-se como parte integrante de uma salvação universal, mesmo ali, aonde estavam e a partir das suas pequenas cruzes diárias, muitas delas que nunca irão ser conhecidas por nós, por terem ficado apenas no silêncio do seu coração diante de Deus.

O sofrer no silêncio foi a grande lição que aprendi com estes pastorinhos, agora santos. 

O seu sofrer não foi um martírio glorioso, antes foi um martírio tão similar aos nossos pequenos martírios do dia a dia. 

Aqui falo das pequenas dores e contrariedades que a nossa doença nos traz no dia a dia, que quase ninguém vê, que quase ninguém percebe.


A dor proveniente de tantas e tantas mazelas, umas mais graves que as outras, todas e nenhuma delas podemos deixar no esquecimento. 

Qualquer cruz podemos transformar em ressurreição, não só da nossa alma, mas também de outras tantas, que podemos converter e levar para o céu.

Isto parece-nos um pouco incompreensível neste mundo em que cada qual parece ser e viver independente dos outros. 

Porém, para Deus, formamos um mesmo rebento, somos todos irmãos, ligados uns aos outros pelo amor filial de Deus. Mesmo que digamos que Deus não existe, Ele é nosso Pai.

A nossa interligação de uns com os outros faz-nos participantes da salvação de todos.

Muitos santos perceberam isso. 

Santa Teresinha do Menino Jesus, por exemplo, foi uma carmelita, que oferecia todas as suas pequenas dores do dia a dia na clausura do carmelo onde vivia, para a salvação de mais almas para Deus. Ela traduziu este caminho espiritual como uma forma bem simples de chegar à santidade através da via da Infância Espiritual. Ela percebeu que não são necessárias grandes coisas para nos tornar santos e santificar outros.

Santa Jacinta Marto não queria ir para o céu sozinha, e percebeu que todo e qualquer sofrimento que tinha, devia ser oferecido a Deus para que assim muitas mais almas se salvassem para também irem para o céu.

São Francisco Marto com apenas oito anos contemplava o Santíssimo Sacramento da Eucaristia e chamava-O Jesus Escondido, que deveria ser Consolado por causa das ofensas e ingratidão com que era ofendido pelos pecadores. Igualmente ofereceu todas as dores da sua doença que o levou à morte, oferecendo-a, sem queixas, pois compreendeu depressa a amplitude do que lhe pedira a Virgem Maria quando lhe apareceu em Fátima.

São palavras muito fortes para simples crianças, podem dizer alguns. Contudo, o que faz deles humanamente adultos é esta consciência da universalidade que nos faz filhos de Deus e todos responsáveis uns pelos outros…

E a doença daquele que ali jaz na cama que materialmente nada oferece, antes pelo contrário, acaba por dar um bem muito maior que nenhum dinheiro poderá comprar.

Quando a deficiência faz-nos suscetíveis e dependentes dos outros, eis que, transformamos esta nossa suposta fragilidade em vitória de Deus não só na nossa vida como na dos outros.

A prova está em “Fátima”. 


Quando há cem anos, os três pastorinhos aceitaram a proposta feita por Nossa Senhora de oferecerem todas as suas dores pelos pecadores da humanidade inteira, nunca imaginaram que esta sua oferta, aos olhos humanos inútil e pequenina, fosse fermentar tanta salvação de almas que todos os dias acorrem a Fátima, não só agradecendo graças, mas muito mais pelo fenómeno do que ali se produz para além do milagre. 

Quantas missas e confissões proporcionaram conversões incontáveis, de almas que antes afastadas de Deus, tornaram-se agora devotas de Maria, aproximando-se também de Jesus e retornando à Igreja e aos Sacramentos! 

E para além disso, o caráter ecuménico que ali se vive, alcançando também muitas almas pelo silêncio daquele lugar que os aproxima de Deus e dos seus mistérios insondáveis.

E tudo começou com aquele oferecimento pequenino dos três pastorinhos que fielmente entregaram aquilo que tinham: a dor e o sofrimento que sentiam e iriam sentir durante as suas vidas!

Por isso, não se iludam, nem pensem que é despropositado este nosso oferecimento das dores diárias a Deus em salvação das almas, especialmente as mais ignoradas e tão esquecidas do purgatório.

Pelas dores do dia a dia, temos a possibilidade de nos ajudarmos uns aos outros, mesmo em silêncio, bastando apenas que de livre vontade ofereçamos a Deus, exatamente esses “espinhos” que corroem o nosso corpo e espírito, dores visíveis e especialmente as invisíveis que apenas são sentidas no coração. Tudo oferecer, no silêncio do coração, aqui está a lógica de que para Deus nada é impossível.

Toda esta nova forma de ver a dor e a doença aprendi e tenho aprendido cada vez que, mais e mais, conheço a vida destes santos da Igreja que a princípio, parece-nos tão infantis, no entanto, tão maduros estão mais na fé do que eu.

Aqui deixo então, as palavras que o Papa dirigiu aos doentes ali presentes no Santuário de Fátima no dia 13 de maio de 2017 que vieram, como que, aprofundar mais e mais este mistério entre a dor humana e a eterna misericórdia de Deus nas nossas vidas:

“Queridos irmãos e irmãs doentes!Como disse na homilia, o Senhor sempre nos precede: quando passamos através dalguma cruz, Ele já passou antes. Na sua Paixão, tomou sobre Si todos os nossos sofrimentos. Jesus sabe o que significa o sofrimento, compreende-nos, consola-nos e dá-nos força, como fez a São Francisco Marto e a Santa Jacinta, aos Santos de todos os tempos e lugares. Penso no apóstolo Pedro, acorrentado na prisão de Jerusalém, enquanto toda a Igreja rezava por ele. E o Senhor consolou Pedro. Isto é o mistério da Igreja: a Igreja pede ao Senhor para consolar os atribulados como vós e Ele consola-vos, mesmo às escondidas; consola-vos na intimidade do coração e consola com a fortaleza.Amados peregrinos, diante dos nossos olhos, temos Jesus escondido mas presente na Eucaristia, como temos Jesus escondido mas presente nas chagas dos nossos irmãos e irmãs doentes e atribulados. No altar, adoramos a Carne de Jesus; neles encontramos as chagas de Jesus. O cristão adora Jesus, o cristão procura Jesus, o cristão sabe reconhecer as chagas de Jesus. Hoje a Virgem Maria repete a todos nós a pergunta que fez, há cem anos, aos Pastorinhos: «Quereis oferecer-vos a Deus?» A resposta – «Sim, queremos!» – dá-nos a possibilidade de compreender e imitar as suas vidas. Viveram-nas, com tudo o que elas tiveram de alegria e de sofrimento, em atitude de oferta ao Senhor.Queridos doentes, vivei a vossa vida como um dom e dizei a Nossa Senhora, como os Pastorinhos, que vos quereis oferecer a Deus de todo o coração. Não vos considereis apenas recetores de solidariedade caritativa, mas senti-vos inseridos a pleno título na vida e missão da Igreja. A vossa presença silenciosa mas mais eloquente do que muitas palavras, a vossa oração, a oferta diária dos vossos sofrimentos em união com os de Jesus crucificado pela salvação do mundo, a aceitação paciente e até feliz da vossa condição são um recurso espiritual, um património para cada comunidade cristã. Não tenhais vergonha de ser um tesouro precioso da Igreja.Jesus vai passar junto de vós no Santíssimo Sacramento para vos mostrar a sua proximidade e o seu amor. Confiai-Lhe as vossas dores, os vossos sofrimentos, o vosso cansaço. Contai com a oração da Igreja que de todo o lado se eleva ao Céu por vós e convosco. Deus é Pai e nunca vos esquecerá.”
(Palavras da Saudação do Santo Padre aos doentes no final da Santa Missa - Adro do Santuário de Fátima - Portugal, a 13 de maio de 2017)



Obrigada, Papa Francisco!


As palavras do Papa Francisco foram retiradas do site do Vaticano em:

Imagens de pinturas originais de Gráccio Caetano




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